Sermão da Montanha
Estrutura do Texto
Existe uma estrutura no Sermão da Montanha. Segue-se dividido desta forma: a) bloco 1: introdução – Mt 5,1-2; Bem-aventuranças – 5,3-12; Sal da terra luz do mundo – 15,13-16; b) bloco 2: A perfeição da lei – 5, 17-48; Não matar – 5,21-16; Adultério – 5,27-32; Juramento – 5,33-37; Lei de talião – 5,38-42; Amor ao próximo e ao inimigo – 5,43-47; Conclusão e evocação da perfeição – 5,48; c) bloco 3: Justiça dos fariseus e de Jesus – 6,1-18; Introdução – 6,1-2; Esmola – 6,2-4; Oração – 6,5-15; Jejum – 6,16-18; d) bloco 4: A decisão – 6,19-34; Deus ou o dinheiro – 6,19-24; Confiança da providência – 6,25-32; Conclusão sobre buscar primeiro o Reino de Deus – 6,33-34; e) bloco 5: 7,1-15 – não julgar; Não dá aos cães o que é sagrado – 7,6; Confiança na oração – 7,7-11; Regra de ouro sobre fazer aquilo que se faz para si – 7,12; f) bloco 6 sobre discernir e optar: Portas estreitas e largas – 7,13-14; Profetas verdadeiros e falsos – 7,15-23; Construção da casa sobre pedra ou areia – 7,24-27; Conclusão do discurso: 7,28-29.
Análise
O conjunto revela a identidade da comunidade cristã. Há uma introdução de Jesus que sobe à montanha, em confronto com a tradição da Lei. Nas bem-aventuranças está a identidade mais profunda da comunidade cristã, é seu rosto. Jesus, como novo Moisés, convida para a vivência/prática da misericórdia, justiça, benevolência, paz... Cada bloco está relacionado. Por exemplo: os que vivem as bem-aventuranças são sal da terra e luz do mundo. Será aquele que constrói a cidade sobre a rocha etc.
No discurso, temos um confronto entre a lei mosaica e o que Jesus propõe. A expressão comum é eu, porém, vos digo... e Jesus acrescenta algo mais à lei judaica. Não abole, mas dá pleno cumprimento às práticas legais. No fundo, Jesus mostra que diante da lei, precisamos ir além, avançar. Quem entra na comunidade cristã tem como referencial, não Moisés, mas o Pai, Deus mesmo. Dai o convite: sede perfeitos, como vosso pai o é (cf. Mt 5,48). Temos um confronto entre as comunidades cristã e judaica.
Jesus também entra na discussão sobre a justiça ou piedade judaica (cf. Mt 6,1s). Os judeus falavam de esmola, oração e jejum. Em Israel, quando o pobre pede esmola, diz sadacar, pede no fundo, justiça. Ora, só tem pobreza porque há injustiça, má distribuição dos bens. O jejum não da comunidade judaica não está em consonância com aquele do profeta Isaias (cf. Is 58), cujo teor é um jejum voltado para a justiça. Jesus introduz esse tema no discurso do sermão da montanha. Nele, a esmola se relaciona com os outros, no sentido de fazer justiça; a oração evoca a relação com Deus e o jejum, a relação consigo mesmo – dai o apelo à prática da abstinência. Entremeando as discussões sobre a Lei, situa-se o Pai Nosso, quer dizer, a oração que nos faz irmãos, o apelo à santificação do nome de Deus, a parusia do Reino, vindo quando todos tiverem pão, quando as pessoas se perdoam, quando na se tem tentações de negar o projeto de Deus e nos inserirmos nos males. O Pai Nosso aparece como uma síntese da espiritualidade cristã. Mateus vai construindo um discurso eficaz para identificar a comunidade cristã. Obviamente, essa identidade supõe que se busque em primeiro lugar o Reino e sua justiça. O projeto de Jesus não é personalista, mas coletivo, comunitário. No Reino, não pode haver julgamento (sobretudo injusto), nem dar aos cães o que é sagrado. É preciso orar e confiar, no sentido de dirigir-se a Deus sempre, frente aos confrontos e conflitos. É da oração que vem a força para fazer com os inimigos aquilo que gostaríamos que fizessem a nós mesmos. Eis o amor aos inimigos. Essa regra de ouro, válida para todas as pessoas, identificará a comunidade cristã de Mateus. Não obstante nossos esforços, há necessidade de opções: passar pelas portas largas ou estreitas; escutar profetas verdadeiros ou falsos; construir nossa casa sobre a pedra ou sobre a areia. A decisão é um pressuposto dos discípulos que seguem os ensinamentos do mestre e o vivem. A conclusão do discurso, em Mt 7, 28 dizendo que a justiça de Jesus é muito maior que a dos fariseus. O referencial da comunidade de Mateus é a perfeição do pai e a vivência das bem-aventuranças.
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Sival Soares, em 13 de maio de 2011