Profecia de Adivinhações
Profecia de Adivinhações
Saul consultou Javé (v6), mas este não lhe respondeu: nem por sonho, nem por adivinhação, nem pelos profetas. A mulher de Edon representa a profecia de consulta, ou seja, a profecia do sonho e urim (adivinhação). A categoria, ou seja, a profecia de consulta dirige-se a Deus. Os e as profetisas consultam a Deus. Sal não tinha resposta de Deus. Ou seja, estava sem profeta. Ocorre que essa mulher não é só consultadora: ela é conhecida, inclusive fora do território de Israel – onde exerce sua profissão. No fundo, a atividade de consulta da mulher é uma ação marginal. Saul tenta driblar o próprio decreto que baixou, a saber, que não devia ter profetas e adivinhos em Israel.
À Margem da Monarquia
O javismo oficial não aceitava adivinhações, necromancia, feitiçaria. A mulher previa um deus ou deuses, ou ainda espíritos (v13). Os deuses não estavam nos céus. Eles vinham da terra. Trata-se de uma antiga visão teológica. A profecia dessa mulher relaciona o sagrado e a divindade como advindos da terra. Aqui temos a marca de uma religiosidade antiga que está presente em Israel. Essa perspectiva vem da África (Egito). Obviamente, essa mulher vê deuses e é aconselhada a identifica-lo com Saul. O verso 15, mostra Samuel falando (ele que havia morrido!). Saul quer saber como enfrentar os filisteus. O que está na boca do Samuel são palavras dos grupos que querem exaltar David. Dai a oposição a Saul. O diálogo dos versos 3-14 dão continuidade nos versos 20-25. Ela termina oferecendo-se para servir a Saul um pedaço de pão. Ele nega, inicialmente, mas depois aceita. No encontro com Saul tem-se um ritual: a mulher oferece novilha e pão asmo. A mulher celebra com Saul. Tem-se a dimensão do cordeiro (novilha) e pães. Quem se alimenta não é só o Rei, mas todos.
Temos, pois, uma narrativa que vai dos versos 3 ao 14 e outra que está dos 20 ao 25. No meio temos o diálogo de Saul com Samuel, centrado na sucessão monárquica.
Fidelidade à lei de Javé
Saul não seguiu a lei javista, segundo a qual só Javé era Deus.
A história da monarquia de Saul é mal contada. Os grupos querem mesmo é exaltar David. A profecia neste texto reside no anúncio da sucessão monárquica. Lembre-se que a monarquia era hereditária. Qual o conflito histórico que há entre Saul e David? Entre eles, não houve linha sucessória. Davi não é filho de Saul. Tampouco Salomão, mais tarde, apesar de ter sido filho de David, não tinha direito ao trono. Para ocupa-lo, teve de matar o herdeiro; Salomão é um safado!
Saul está atrelado à tribo de Bejamin, que se enriqueceu pelo uso e domesticação do boi. Enriqueceu pelo comércio e pela produção. Esse lugar social é significativo para entender os conflitos em torno de Saul e David.
David vem dos grupos dos Apirus, hebreus empobrecidos que promoviam os saques. Por isso a imagem de David guerreiro, atacador etc. Salomão é o contrário dos outros dois. Representa a aristocracia urbana. Fato comum é que entre os reis, historicamente, não há hereditariedade na monarquia. Entre Saul e Salomão, temos a palavra da profecia que justifica a não sucessão hereditária. Essa é, exatamente, a profecia da adivinhação, dos sonhos, das visões etc.
Em 2Sm 7, temos o “profeta” Natã. Ora, David queria edificar um templo. Na verdade, será o filho quem construirá. De fato, Salomão o fará. No fundo, o texto quer justificar a sucessão monárquica hereditária. Mas a profecia reside no fato de Javé dizer para Natã que não quer casa. Natã, por sua vez, diz a Davi que quem construirá a casa para Javé será Salomão. Temos duas profecias: uma antitemplo, outra pró-Salomão. Natã muda as palavras de Javé. Sabemos que os textos deuteronomistas foram escritos no Exílio ou no Pós. Por isso a noção de que Deus não permitirá mais que andem errantes. Ora, esse discurso é típico de uma sociedade onde não tem unidade política e cultural.
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Sival Soares, em 29 de abril de 2011