Elias e Eliseu
Elias e Eliseu
O ciclo de Elias situa-se no reinado de Acab, marcado por alianças e interesse tributário. O governo de Acab também é marcado pelo interesse pela religião. As alianças eram, como se sabe, permeadas por questões religiosas. Por razões políticas, se casa com Jezabel, faz aliança com Josafá etc. Nesse jogo de política e tributos, surgem muitos conflitos. O ambiente é marcado pela guerra. A maior delas é a de Israel (Judá) contra a Síria. O resultado de um governo marcado por tributo tem como resultado a escassez de produção, a fome em âmbito social.
O estudo de 1Rs 18,5s mostra que o rei estava preocupado com os cavalos, com a guerra. Sua preocupação era militar, com o exército. Nessa época, um bom rei deveria ter um excelente general e um confiável sacerdote; aquele que mantém os interesses militares e aquele que mantem a religião a serviço da monarquia. O exército e o sacerdote existiam para saquear, roubar, extorquir impostos.
Profetismo e Realidade
A primeira coisa que descobrimos no Elias é que sua profecia está ligada à falta de chuva. Sem ela, não há produção e a fome se alastra. A crítica ao tributo, à idolatria (com relação a baal, deus da chuva, que está atrelado ao Estado) são evidências neste profeta. O pior ídolo é quando no Deus verdadeiro (Javé, por exemplo) vira ídolo, quando o deus do povo é profanado. O grande problema em Israel é a passagem da idolatria para a monolatria: adoração de Javé como Deus único. Javé vira ídolo.
Elias, contra baal, denuncia que não vai chover. Com isso, expulsa baal. Nos mitos antigos esse deus é conhecido como cocheiro das nuvens. Para o agricultor, a chuva é sinal de bênçãos. A grande questão de Elias é saber quem controla a produção agrícola. Sua profecia está recheada de ironia. No capítulo 17 de 1Rs afirma que no lugar onde está baal não tem chuva. Sinal que ele não está com nada. É fraco. O capitulo 17 conta a história da viúva de Sarept (lugar de origem de baal). Ora, nem em sua terra natal ele funciona. Essa é a primeira ironia. A segunda é quando Elias convoca os sacerdotes e profetas de baal para fazer o sacrifício. Pergunta até quando eles irão ficar mancando, entre os lados de baal e Javé? Elias propõe até o outro dia, ao meio-dia, o deus mandar fogo sobre as oferendas, este será o deus verdadeiro. Os profetas de baal perdem as apostas. Elias cava uma cova, põe oferenda, enche de água. Ironicamente, Javé manda fogo. Elias, segundo a literatura irônica, destrói os outros profetas. Trata-se da profecia do círculo. Somente dois profetas se enquadram nessa profecia: Elias (X ou IX século) e Haninas ben Dosa (II século antes de Cristo). Estes último profeta só aparece nos textos rabínicos. Ele aparece no ambiente da guerra dos Macabeus, na conjuntura da política dos asmoneus. Haninas, assim como Elias, tem a ver com o sacrifício, com o problema da chuva etc.
Ao redor da história de Elias tem muitos profetas contra ele. E não era um profeta solitário. Havia um grupo de profetas (de Javé) que sustentavam Elias. Note-se que há um conflito entre profetas de Javé e de baal; os que não estavam a serviço do rei e os que o criticavam. Elias não existe sozinho.
Aspectos Literários
Quem costura esse texto sobre Elias, une profecia popular, como a de Elias que é guiado pela palavra (dabar), marcado pelo caminho... e os profetas de baal, que estão a serviço do rei (cf. 2Rs 17,2s). Elias é tesbita, região de galaad. Mas ele está em Israel. Javé o manda ir para Calit, uma torrente junto ao Jordão, no oriente. Lá mora, come... O versículo 9 pede para que Elias vá para Sarepta, onde ocorre o episódio da viúva (todo o cap. 17 de 1Rs). Em 1Rs 18 Javé manda, novamente, Elias ir: “Vai te apresentar a Acab”, que estava na Samaria. Nesse capítulo ocorre a disputa com os profetas de baal. Em seguida, vaza porque Jezabel o ameaça de cortar a cabeça.
Em 1Rs21,17-18, vemos Elias indo para Jesrael. Em 2Rs 2,1s, continua a narrar o caminho de Elias, segue-se o arrebatamento dele para os céus. Em todo caso, insiste-se no verbo sair e ir, mesmo conjugados em tempos diferentes. Narra suas idas à Galgal, Betel, Jericó, Jordão... Nesse último rio, Elias abril (como Moisés e Josué) o rio e passou. Nesse lugar Elias diz para Eliseu (e o grande grupo de profetas): pede o queres. Eliseu pede o espírito de Elias. Enquanto andavam, um carro de fogo arrebatou Elias. Eliseu grita e fica com o manto de Elias, objeto sagrado. Do Jordão, Elias vai para o céu. Eliseu volta por aonde veio, sendo que finaliza seu percurso na Samaria, onde inicia sua profecia. O autor dos textos oferece uma construção de caminhos: o de Elias para o céu; o de Eliseu e o bando de profetas para a Samaria. O arrebatamento, na verdade, fala teologicamente do fato de o profeta ser íntegro e temente a Deus. Só três pessoas na tradição do Antigo Testamento são arrebatado: Noé, Enoc (Gn 5) e Elias.
__________________________________
Sival Soares, em 29 de abril de 2011